segunda-feira, junho 03, 2013

Medula óssea normal

Medula óssea normal

A hematopoiese é confinada, na vida extrauterina normal, à medula óssea que ocupa os interstícios interiores do osso. A medula é uma estrutura interior do osso, com forma de favos de mel, cujos interstícios forma as cavidades medulares e contêm a medula óssea. A medula óssea é formada pela medula vermelha, que contém as células hematopoiéticas, e a medula amarela ou gorda, que contém tecido adiposo. A distribuição da medula óssea depende da idade do doente. Nos recém-nascidos, a cavidade medular é totalmente ocupada por células hematopoiéticas proliferativas, ocorrendo hematopoiese mesmo nas falanges; à medida que a idade avança, a hematopoiese vai-se tornando cada vez mais centrípeta, sendo substituída por medula amarela, tornando a hematopoiese confinada, nos adultos, ao crâneo, vértebras, costelas, clavículas, esterno, pélvis e metade proximal dos húmeros e fémures.

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Embora os osteoblastos e osteoclastos compartilhem a superfície das trabéculas ósseas, elas originam-se de células diferentes. Osteoblastos, e assim os osteócitos, são de origem mesenquimatosa, derivando da mesma stem cell dos condrócitos e, provavelmente, dos fibroblastos do estroma, enquanto que os osteoclastos derivam da stem cell hematopoiética, sendo formados da fusão de células da linhagem monocítica.
Células hematopoiéticas da medula óssea estão embebidas num estroma de tecido conjuntivo que ocupa os espaços intertrabeculares da medula. O estroma é formado por células gordas, vasos sanguíneos, fibroblastos, macrófagos, fibras nervosas mielinizadas ou não e reticulina. As células do estroma incluem as células reticulares que englobam 2 tipos celulares, sendo umas as células fagocíticas de reticulina, que são macrófagos originários das células progenitoras hematopoiéticas, e as outras são células não fagocíticas reticulares relacionadas com os fibroblastos, células adventícias dos sinusoides e, provavelmente, osteoblastos e condrócitos, diferindo estas daquelas por estas últimas serem fosfatase alcalina positivas.
O conteúdo gordo da medula varia na razão oposta da medula vermelha. A gordura da medula é fisiologicamente diferente da gordura subcutânea, sendo a gordura medular a última a ser perdida nos casos de jejum prolongado e fome. Na perda rápida do tecido hematopoiético medular, este é substituído por tecido mucinoso, que posteriormente é substituído por tecido gordo.
Com excepção de alguma trombocitopoiese extramedular, no homem a hematopoiese é confinada à medula óssea e, em específico, ao interstício medular. Em condições patológicas, a hematopoiese pode existir dentro dos sinusoides.

Exame da medula óssea

As 2 técnicas principais de obtenção de amostras de medula óssea, que são complementares, são a biópsia por aspiração e a biópsia óssea. O aspirado de medula óssea é realizado, geralmente, no esterno ou na crista ilíaca. Nos recém-nascidos e até aos 18 meses, geralmente, pode usar-se o aspirado da tíbia.
Embora se possa realizar indistintamente a aspiração de medula óssea do esterno ou da crista ilíaca, verifica-se que a aspiração esternal dá melhores informações.
O aspirado de medula óssea pode falhar completamente, sendo o que se chama de “dry tap” que pode significar uma histologia normal medular mas, mais frequentemente significa uma doença, como metástases neoplásicas, LMC, mielofibrose primária ou leucemia a células em cabeleira com fibrose associada. Noutras ocasiões, o aspirado apenas revela sangue que é frequentemente resultado de fibrose da medula óssea.
Aspirado de medula óssea permite o estudo citológico fino. Permite também um amplo leque de estudos citoquímicos e de marcadores imunológicos. Aspirado de medula óssea é muito útil quando se investiga doentes com suspeita de anemia de deficiência de ferro, anemia das doenças crónicas, anemia megaloblástica e leucemia aguda. Biópsia óssea, por permitir o estudo da arquitectura óssea, é de particular interesse em casos de anemia hipoplásica ou aplásica, linfomas, carcinomas metastáticos, doenças mieloproliferativas e doenças ósseas.

Celularidade

O estudo da celularidade medular é melhor avaliado por estudo histológico, embora o mielograma também possa dar uma boa indicação.
Em indivíduos saudáveis, a celularidade da medula óssea depende da idade e do local onde foi realizada a colheita da amostra, sendo também afectada por causas técnicas, como descalcificação das amostras parafinadas que diminui a celularidade comparativamente com amostras trabalhadas em resina e não parafina.

Células hematopoiéticas

Uma stem cell multipotencial origina todas as células hematológicas


a) Eritropoiese: precursores dos eritrócitos são os eritroblastos que apresentam, pelo menos, 5 gerações celulares entre a stem cell eritróide morfologicamente não reconhecida e o eritrócito. Várias gerações de eritroblastos estão associadas a um macrófago, sendo o conjunto celular chamado de ilha eritroblástica




Proeritroblastos  são  células  grandes,  redondas, com 12-20 μm de diâmetro e um núcleo redondo e grande, com citoplasma basófilo e uma zona perinuclear pálida ( correspondendo ao complexo de Golgi ); o núcleo apresenta vários nucléolos.
Eritroblastos basófilos são células menores que os proeritroblastos, e mais numerosos, com   uma  relação   núcleo/citoplasma  menor  e  um  citoplasma  fortemente  basófilo  e uma cromatina granular, sem nucléolos visíveis; pode ser visto um halo perinuclear, menos basófilo que o resto do citoplasma.



Eritroblastos policromatófilos são menores e mais numerosos que os anteriores, apenas ligeiramente maiores que os eritrócitos maturos, com uma relação núcleo/citoplasma menor que a verificada nos eritroblastos basófilos, e com cromatina mais condensada; o citoplasma é fracamente basófilo e tem também uma coloração rosa devido ao aumento da concentração da hemoglobina.
Eritroblastos ortocromáticos extrudem o seu núcleo, sendo umas células ligeiramente maiores que os eritrócitos normais e com núcleo muito compacto.

b) Granulopoiese: há, pelo menos, 4 gerações celulares entre o precursor granulócito-monócito irreconhecível e o granulócito maduro.
A primeira célula reconhecível como granulopoiética é o mieloblasto, que é similar ao proeritroblasto com 12-20 μm de diâmetro, com uma forma mais irregular que o proeritroblasto, e seu citoplasma mais basófilo; tem uma cromatina difusa e vários nucléolos visíveis.


                            
Mieloblasto
                                            

                                                     Mieloblasto, promielócito e mielócito

Os mieloblastos apresentam-se geralmente sem grânulos. Os mieloblastos podem dividir-se e maturar para promielócitos.
Promielócitos são células com núcleo ligeiramente indentado e que apresentam nucléolos, uma zona de Golgi e grânulos primários ou azurófilos presentes, que coram de vermelho-púrpura. Os promielócitos são células de 15-25 μm de diâmetro e um citoplasma fortemente basófilo. Podem dividir-se ou maturar para mielócitos.
Mielócitos são células de 10-20 μm de diâmetro, com núcleo com cromatina condensada e já sem nucléolos, citoplasma menos basófilo que o dos promielócitos, e grânulos específicos de neutrófilos,  eosinófilos  ou  basófilos  podem  ser  observados,  corando  de lilás, laranja  ou  púrpura  respectivamente.  Alguns  dos  mielócitos  podem  dividir-se  ( originando uma segunda geração de mielócitos ) enquanto que os mielócitos de 2ª geração maturam para metamielócitos.
Metamielócitos são células de 10-12 μm de diâmetro, com um núcleo em forma de U, que não é capaz de divisão celular e matura para bastonete, célula esta que apresenta um núcleo em bastão, que por sua vez matura para neutrófilo, eosinófilo ou basófilo, que apresentam um núcleo segmentado e com grânulos específicos.
c) Monocitopoiese: monócitos são derivados de um precursor granulócito-monócito morfologicamente indistinguível. O primeiro percursor que se pode distinguir é o monoblasto, uma célula maior que o mieloblasto, com citoplasma abundante e variável basofilia, e um núcleo grande e redondo. Monoblastos são células capazes de se dividirem e maturarem para promonócitos, que são similares, em tamanho, aos promielócitos, apresentam nucléolos, alguma lobulação nuclear e grânulos azurófilos citoplasmáticos. Promonócitos maturam em monócitos que migram rapidamente para o sangue periférico. Os monócitos têm 12-20 μm de diâmetro, um núcleo lobulado e abundante citoplasma fracamente basófilo, com pequeno número de grânulos azurófilos. Os monócitos maturam em macrófagos, tanto na medula óssea como noutros tecidos. Macrófagos são células grandes, de 20-30 μm de diâmetro, de forma irregular, com relação núcleo/citoplasma baixa e grande citoplasma, fracamente basófilo. Uma coloração para o ferro demonstra a presença de hemossiderina.

Megacariopoiese e trombopoiese

Megacariócitos provêm das stem cells hematopoiéticas através da via comum dos progenitores megacariócitos-eritrócitos, que originam os precursores eritróides e os megacarioblastos. Estas são pequenas células proliferativas, com núcleo diplóide, geralmente não visualizadas na medula óssea. As primeiras células desta linhagem, distinguidas na medula óssea, são os megacariócitos, embora quando a hemopoiese é anormal pode-se visualizar megacarioblastos de tamanho e morfologia semelhante aos mieloblastos.  Megacariócitos  sofrem  endorreduplicação,  resultando  em  células grandes,  de  30-160 μm  de  diâmetro, com grande heterogeneidade do conteúdo nuclear de DNA ( ploidia ) e tamanho nuclear. Os megacariócitos podem dividir-se pela sua ploidia, sendo que, na normalidade, podem variar de 4 N a 32 N, com ploidia predominante de 16 N. Os megacariócitos também se podem dividir pelas características nucleares e citoplasmáticas. Nesta base, os megacariócitos podem ser classificados do seguinte modo:
  • Grau I: citoplasma fortemente basófilo e grande relação núcleo/citoplasma
  • Grau II: menor relação núcleo/citoplasma com citoplasma menos basófilo e com granulações azurófilas
  • Grau III: células maduras, capazes de produzirem plaquetas, e já não sintetizam DNA
O grau I é o único grau de megacariócitos com núcleo 4 N, e os megacariócitos 32 N são mais numerosos no grau III. Todos os estadios podem apresentar megacariócitos 4 N, 8 N, 16 N e 32 N.
Proliferação de megacariócitos e produção de plaquetas são primariamente reguladas por interacção entre trombopoietina e o seu receptor de superfície, MPL. Um aumento das necessidades plaquetárias, por exemplo por destruição periférica, leva a um aumento da ploidia e do tamanho celular.



Megacariócito senescente que já libertou muitas plaquetas do seu citoplasma


É importante caracterizar os megacariócitos tanto em número como em morfologia. Megacariócitos podem englobar outras células hematológicas, como linfócitos, eritrócitos, eritroblastos, granulócitos e seus percursores, um fenómeno chamado de emperipolesis, aparecendo as células engolfadas, como células perfeitamente normais e preservadas morfologicamente.




Linfopoiese

Linfócitos: os linfócitos B e T compartilham uma origem comum com as células mielóides, derivando todas de uma stem cell pluripotencial. A medula óssea possui percursores das linhagens B e T. Os linfócitos da medula óssea são pequenos linfócitos, com uma relação núcleo/citoplasma alta e escasso citoplasma, fracamente basófilo. O núcleo apresenta cromatina condensada, mas frequentemente mais difusa que nos linfócitos do sangue periférico. Os linfócitos constituem 25-30% das células medulares, nas crianças, e declinam para 15-25% ou menos nos adultos. Se não há hemodiluição, o número de linfócitos é de cerca de 10% das células nucleadas presentes na medula óssea, sendo a maioria linfócitos T CD8 positivo ( normalmente a razão T:B é de cerca de 6:1 )

Plasmócitos: células raras na medula óssea normal, constituindo menos de 1% das células nucleadas, sendo ainda menos frequentes nas crianças saudáveis. São células de 15-20 μm de diâmetro, com núcleo excêntrico, citoplasma basófilo e uma zona de Golgi paranuclear proeminente. A cromatina apresenta proeminentes agregados. Ocasionalmente os plasmócitos podem apresentar 2 ou mais núcleos e podem aparecer em aglomerados celulares.



Composição celular da medula óssea

A composição celular do aspirado da medula óssea é fortemente influenciada pela quantidade de material aspirado, visto que tanto maior o volume aspirado maior a quantidade de sangue sinusoidal colhido. A diluição com sangue medular leva a um aumento percentual dos linfócitos e granulócitos maduros e uma diminuição percentual dos percursores eritróides e granulocíticos.
Devem ser contadas 500-1000 células para se determinar uma mais precisa distribuição dos diferentes tipos celulares.
É útil a determinação da relação M:E pois esta, dada em conjunto com a celularidade, informa sobre se a eritropoiese e a granulopoiese são reduzidas, normais ou aumentadas.

Relatório de um mielograma


O relatório de um mielograma deve dar indicação dos dados clínicos, fornecidos pelo hematologista, e um report da contagem de sangue total e esfregaço de sangue periférico na data do aspirado de medula óssea. Deve ser referenciada a localização da aspiração, consistência óssea e facilidade da aspiração. Deve constar a referência à celularidade total, relação M:E e descrição de cada linhagem. Depósitos de ferro, intra e extracelulares, estudados com a coloração de Perls, devem ser referidos. Uma descrição dos achados significativos deve ser feita, e uma proposta de diagnóstico deve ser mencionada.

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